- Mas eu não
estou entendendo nada do que você está falando! – exclamou a Menina, aflita.
- Caga na
cabeça! Caga na cabeça! – continuou a Pomba Urbana, em fluxo. – São 150 pombos
para um velhinho jogando migalhas! Quem não come não vive! Cuidado com o carro!
Já era: pomba no asfalto!
- Eu não
consigo com toda essa loucura... – desabafou a Menina.
- A loucura
não é nossa, Menina. – respondeu a Pomba Urbana, subitamente profética. – Nós,
pombas urbanas, somos meros espelhos, reflexos orgânicos da cidade agitada.
- Então você
tem momentos de lucidez?
- Menino com
estilingue no telhado! Desviar da roda! Desvia do gato! Nossos ninhos ficam
escondidos no alto, nas dobras dos viadutos e estátuas. As pombas filhotes
piam, piam...
- Não deve
ser uma vida fácil. – Concluiu a Menina, intrigada.
- A vida não
é uma coisa medida em facilidades, Menina. A sobrevivência que é assim, há
momentos fáceis e momentos difíceis de sobreviver. Mas a vida... A vida...
- A vida...?
– continuou a Menina, esperando uma resposta.
- Migalhas!
Senhora a oeste jogando migalhas! – exclamou a Pomba Urbana. E foi embora, sem
se despedir, voando em direção ao outro lado da praça, junto com dezenas de
outras pombas urbanas, disputar as migalhas jogadas pela velhinha.
Naquela
noite, a Menina teve um sonho estranho. Sonhou que a cidade inteira era um
grande manicômio com muros bem altos e ela, a Menina, era uma pomba, que alçava
voo com suas asas. E voava. Para além dos muros.
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