- Mas você é
muito impositivo. – disse a Menina, instigada.
- E o que
você esperava? – respondeu o Muro, com naturalidade. – A imposição é a
principal característica que carregamos, nós, muros que separam as propriedades.
Nosso trabalho é esse: impor no espaço uma série de recortes.
- E vocês
recortam o espaço para que?
- A pergunta
certa, Menina, não é para que, e sim, para quem. Recortamos o espaço por desejo
da humanidade. Ou pelo menos de uma parte dela. Nós, muros, somos a
materialização da vontade de alguns.
- Que
vontade?
- Não é
óbvio? A vontade de alguns de pegar para si uma parte do espaço. Essa é nossa
real função: garantir que os lugares possam ter donos. Não é um trabalho muito
bonito, mas fazemos sem reclamar. É com ele que se definem as fronteiras de
todas as coisas: países, fazendas, fábricas, prédios. É a dureza de nossas
pedras e tijolos que garantem as propriedades do mundo.
- Mas... e
as pessoas que não tem espaço algum? Como ficam? – retrucou a Menina.
- Do lado de
fora. – disse o Muro, definitivo. – Essa é nossa obrigação fundamental:
garantir as desigualdades dos espaços onde a humanidade existe. Cumprimos nosso
dever de muros a muitos milênios, desde os primeiros passos da sua espécie.
- Isso é
muito sufocante... – falou a Menina, aflita.
- Depende do
ponto de vista. Mas lembre-se sempre disso: não existem muros que não possam
ser derrubados. – finalizou o Muro. – Nesse mundo, Menina, tudo que tranca,
trinca.
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